A mulher de Ló: uma metáfora sobre o prender-se ao passado
Muitas pessoas desejam começar uma vida nova, porém, ficam presas ao passado. O
olhar que deveria estar presente nos novos horizontes das
possibilidades oferecidas pela vida fica perdido nos erros de um passado
que já passou. Olhar em direção às possibilidades da vida é uma bonita
maneira de recomeçar a caminhada. Ficar com os olhos presos a um passado
mal-sucedido é dar vida a sofrimentos que já deveriam estar sepultados.
No
livro de Gênesis, encontramos uma passagem em que anjos aparecem a Ló e
pedem que ele e sua família deixem o território onde vivem e partam
para as montanhas, pois Sodoma e Gomorra seriam destruídas. Esses seres
celestes os alertaram sobre o risco que eles correriam de ser
transformados em estátuas de sal se olhassem para trás na fuga. No
entanto, a mulher de Ló desobedeceu, olhou para trás e se tornou uma
coluna de sal (cf. Gênesis 19,17-29).
Há
três tipos de pessoas: 1) as que vivem no passado; 2) as que vivem no
futuro; e 3) as que vivem no presente. A mulher de Ló voltou seu olhar
para Sodoma e Gomorra. Possivelmente sentiu saudade de tudo aquilo que
estava deixando para trás. O gesto de voltar-se e olhar em direção a um
passado pode revelar muitas coisas escondidas no coração daquela mulher.
Muitas pessoas vivem do passado. Alimentam
sua vida de coisas que já se foram. Dão vida a sofrimentos que já estão
sepultados. Não conseguem estabelecer uma relação saudável com o hoje
de sua existência. Procuram no passado certezas que se encontram no
presente.
A
mulher de Ló ficou presa a um passado que não mais lhe pertencia. Por
isso tornou-se uma coluna de sal. Ficou petrificada, com o olhar e o
coração presos àquilo que não mais deveria ser o essencial da vida.
Quando se perde o essencial da vida presente, fica-se petrificado com o
coração no passado. Dar vida a um passado de sofrimentos,
incompreensões, desilusões, erros, é alimentar-se de sombras.
Mesmo que desejássemos do mais profundo de nosso coração,
não poderíamos fazer, nem sequer um milésimo de segundos, o que passou
voltar. O que podemos fazer é nos reconciliarmos com o passado de nossa
história. É vivermos o hoje como um presente de Deus. Tudo é graça! E
Deus Pai nos presenteia a cada dia com o Seu amor, manifestado no dom da
vida em suas múltiplas e infinitas possibilidades.
Olhar
para o passado e buscar nele aquilo que não nos torna humanos é
olharmos para as sombras de nossa existência e nos alimentarmos dela. Olhar o hoje de nossa história é reconhecermos a graça de Deus manifestada na esperança de um novo tempo a cada um de nós.
Padre Flávio Sobreiro
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