Seguir Jesus é estar disposto a transformar o mundo
Cada
um de nós tem lá suas ideias a respeito de como deve se apresentar e
como deve ser tratada uma pessoa importante. Acabamos projetando em
Jesus essas concepções. É natural!
Faz parte da nossa maneira de entender a vida. Por isso, quando se faz
um filme da vida de Cristo, tudo é muito bonito e respeitoso. Até a
crucificação é filmada com certa grandiosidade, colorido e iluminação
adequada, para solenizar o momento sagrado.
Será que já nos demos conta de que os últimos dias da vida de Jesus não
foram exatamente assim? Conseguimos imaginar o Senhor sendo torturado
numa delegacia de hoje, sem cenário solene, tratado como “Zé-ninguém”,
na crueza do dia a dia da violência humana? Entre
a entrada festiva como rei em Jerusalém e o deboche da flagelação e da
coroação de espinhos e da inscrição na cruz (Jesus de Nazaré, Rei dos
Judeus), somos levados a pensar: Que tipo de rei o povo queria? E que
tipo de rei Jesus, de fato, foi?
O
povo ansiava por um Messias, mas cada um o imaginava de um jeito:
poderia ser um rei, um guerreiro forte que expulsasse os romanos, um
“ungido de Deus”, capaz de resolver tudo com grandes milagres. É verdade
que havia também textos que falavam do Messias sofredor, que iria
carregar os pecados do povo. Mas essa ideia tão estranha não tinha assim
muito apelo. Talvez o povo pensasse como muita gente de hoje: “De
sofredor já basta eu! Quero alguém que saiba vencer”.
Deus, como de costume, exagera na surpresa. O Messias, além de não vir alardeando poder, entra na fila dos condenados. Para
quem não olhasse a história com os olhos de hoje, não haveria muita
diferença entre as três cruzes no alto do Monte Calvário.O
processo, a condenação e a execução de Nosso Senhor Jesus Cristo foram
uma grande coleção de desrespeitos aos direitos humanos. O julgamento
foi rápido, sem provas suficientes, sem direito de defesa. A tortura
precede a morte, e a humilhação faz parte da pena.
Como
logo depois vem a ressurreição, ascensão, glória etc... esquecemos
depressa a imagem de Jesus como servo indefeso, como um judeu sem
importância a quem as autoridades mandaram para a morte com aquele pouco
caso com que costumam, tantas vezes, ser tratados até hoje os direitos
dos pobres, especialmente, quando estes são acusados de algum delito,
falso ou verdadeiro. “Este homem era
realmente o Filho de Deus”. Esta é a conclusão do centurião que comandou
a crucificação. Isso sabemos nós hoje, à distância de mais de dois mil
anos, acostumados a honrar Jesus de todas as formas.
Que
estranho rei e Filho de Deus é esse que se submete à tortura, que se
deixa confundir com os dois ladrões que morrem a Seu lado? Percebemos
que Deus está assumindo aí todos os nossos pecados e todas as nossas
tragédias? Que está participando do destino de todos os que sofrem,
inocentes e culpados? Quem está tomando posição diante da dor humana?
Não basta trazer flores para o crucifixo, louvar a Cristo com ramos bentos,
fazer questão de ser chamado de cristão. Será que Jesus se contenta com
isso tudo se não tivermos solidariedade com aqueles que hoje são
companheiros de cruz de Nosso Senhor e nossos ritos não traduzirem nossa
fé?
Estamos
já no século XXI. São dois milênios em que nos acostumamos com o Cristo
aclamado, nos habituamos com o símbolo da cruz, oramos ao Cristo
poderoso nas necessidades. Será que não está na hora de perceber e viver
melhor o apelo que nos vem do Filho de Deus, que aceitou ser um judeu
sem defesa, a quem os poderosos trataram como um malfeitor?
Precisamos
ser, como Jesus, uma Igreja servidora, missionária, evangelizadora e
solidária com os que sofrem, compassiva com os caídos, disposta a
transformar a injustiça do mundo, confiando mais na força do amor do que
no poder
Dom Eurico dos Santos Veloso
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