Ele vai transfigurar nosso corpo humilhado, conformando-o ao seu corpo glorioso (Fl 3,21)
O episódio
misterioso da Transfiguração de Jesus sobre um monte elevado, o Tabor,
diante de três testemunhas escolhidas por ele: Pedro, Tiago e João, se
situa no contexto a partir do dia em que Pedro confessou diante dos
Apóstolos que Jesus é o Cristo, “o Filho de Deus vivo”. Esta confissão
cristã aparece também na exclamação do centurião diante de Jesus na
cruz: “Verdadeiramente este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39), pois
somente no Mistério Pascal o cristão pode entender o pleno significado
do título “Filho de Deus”.
A partir desta revelação de Pedro, inspirado pelo Pai, Jesus, diz S.
Mateus, “começou a mostrar a seus discípulos que era necessário que
fosse a Jerusalém e sofresse… que fosse morto e ressurgisse ao terceiro
dia” (Mt 16,21). Pedro rechaça este anúncio, os demais também não o
compreendem, mas Jesus mostra a eles que afastá-lo do cálice da Paixão,
que ele deveria beber, era ser movido por Satanás.
O Evangelho segundo São Lucas destaca a ação do Espírito Santo e o
sentido da oração no ministério de Cristo. Jesus ora antes dos momentos
decisivos de sua missão: antes de o Pai dar testemunho dele por ocasião
do Batismo e também antes da Transfiguração, e antes de realizar por sua
Paixão o plano de amor do Pai.
O rosto e as vestes de Jesus Cristo tornam-se fulgurantes de luz, Moisés
e Elias aparecem, e é importante notar que o evangelista destaca sobre o
que eles falavam: “de sua partida que iria se consumar em Jerusalém”
(Lc 9,31). Uma nuvem os cobre e uma voz do céu diz: “Este é o meu Filho,
o Eleito; ouvi-o” (Lc 9,35). A nuvem e a luz são dois símbolos
inseparáveis nas manifestações do Espírito Santo. Desde as manifestações
de Deus (teofanias) do Antigo Testamento, a Nuvem, ora escura, ora
luminosa, revela o Deus vivo e salvador, escondendo a transcendência de
sua Glória: com Moisés sobre a montanha do Sinai, na Tenda de Reunião e
durante a caminhada no deserto; com Salomão por ocasião da dedicação do
Templo.
Na Transfiguração a Trindade inteira se manifesta: o Pai, na voz; o
Filho, no homem; o Espírito, na nuvem clara. E Jesus mostra sua glória
divina, confirmando, assim, a confissão de Pedro. Mostra também que,
para “entrar em sua glória” (Lc 24,26), deve passar pela Cruz em
Jerusalém. Moisés e Elias haviam visto a glória de Deus sobre a
Montanha; a Lei e os profetas tinham anunciado os sofrimentos do
Messias. Fica claro que a Paixão de Jesus é sem dúvida a vontade do Pai:
o Filho age como servo de Deus.
A rica liturgia bizantina assim reza na festa da Transfiguração: “Vós
vos transfigurastes na montanha e, porquanto eram capazes, vossos
discípulos contemplaram vossa Glória, Cristo Deus, para que, quando vos
vissem crucificado, compreendessem que vossa Paixão era voluntária e
anunciassem ao mundo que vós sois verdadeiramente a irradiação do Pai.”
No limiar da vida pública de Jesus temos o seu Batismo; no limiar da
Páscoa, temos a sua Transfiguração. Pelo Batismo de Jesus foi
manifestado o mistério da primeira regeneração: o nosso Batismo; já a
Transfiguração mostra a nossa própria ressurreição. Desde já
participamos da Ressurreição do Senhor pelo Espírito Santo que age nos
sacramentos da Igreja. A Transfiguração dá-nos um antegozo da vinda
gloriosa do Cristo, como disse São Paulo, “Ele vai transfigurar nosso
corpo humilhado, conformando-o ao seu corpo glorioso” (Fl 3,21). Mas ela
nos lembra também que com Jesus “é preciso passarmos por muitas
tribulações para entrarmos no Reino de Deus” (At 14,22). Por isso, como
Cristo, o cristão não deve temer o sofrimento.
Unidos a Cristo pelo Batismo, já participamos realmente na vida celeste
de Cristo ressuscitado, mas esta vida permanece “escondida com Cristo em
Deus” (Cl 3,3). “Com ele nos ressuscitou e fez-nos sentar nos céus,
em Cristo Jesus” (Ef 2,6). Nutridos com seu Corpo na Eucaristia, já pertencemos ao Corpo de Cristo. Quando ressuscitarmos, no último dia, nós também seremos “manifestados com Ele cheios de glória” (Cl 3,3).
em Cristo Jesus” (Ef 2,6). Nutridos com seu Corpo na Eucaristia, já pertencemos ao Corpo de Cristo. Quando ressuscitarmos, no último dia, nós também seremos “manifestados com Ele cheios de glória” (Cl 3,3).
Santo Agostinho nos ensina que: “Pedro ainda não tinha compreendido isso
ao desejar viver com Cristo sobre a Montanha. Ele reservou-te isto,
Pedro, para depois da morte. Mas agora Ele mesmo diz: Desce para sofrer
na terra, para servir na terra, para ser desprezado, crucificado na
terra. A Vida desce para fazer-se matar; o Pão desce para ter fome; o
Caminho desce para cansar-se da caminhada; a Fonte desce para ter sede; e
tu recusas sofrer?” (Sermão 78,6).
Assim, pela Transfiguração Jesus preparou os discípulos para não se
escandalizarem com a sua Paixão e morte na Cruz, o que para eles foi um
trauma e um grande desafio; mostrou-lhes a Sua glória e divindade; e
deu-lhes conhecer um antegozo do Céu. Mas para isso, como Ele, temos que
passar pelas provações deste mundo, sempre ajudados pelas consolações
de Deus.
Prof. Felipe Aquino
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